segunda-feira, 8 de abril de 2013

Poder? Apenas Coragem

Este texto foi publicado no encarte Mais Canoas, dos Jornais Zero Hora e Diário Gaúcho, dia 29/03/2013.

Agradeço a todos que leram, compreenderam e deram apoio a estas palavras. E, a pedido de muitas pessoas que não leram, repito aqui, na íntegra.
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Poder? Apenas coragem.

Faço parte da equipe diretiva de uma grande escola pública. Uma grande escola, não em espaço físico ou por apresentar caríssimos recursos pedagógicos, pois nossa realidade é bem o oposto disto. Grande em história. Em 2013, o Grupo Escolar do Centro, hoje Escola Estadual de Ensino Fundamental Canoas, completa 50 anos.

Sou professora e vice-diretora, junto a corajosa equipe que coordena este espaço. Fomos eleitas para um segundo mandato. É comum vermos esta situação: a recondução de pessoas que abraçam o trabalho, que fazem dele mais do que uma tarefa e por isso, ganham a confiança de sua comunidade. Na Escola Canoas, isto não é nenhuma novidade, já que por vezes as equipes diretivas se repetiram.

No ano do cinquentenário, quero também, como parte desta equipe, externar um grito de alerta, ou apenas de desabafo. Há uma sufocação pairando no ar. E assim é preciso respirar, inflar-nos de arejamento. Somos parte de uma engrenagem maior, a educação. Colaboramos com este andar, tentando alavancar resultados. Sentimos o peso de cargas que não deveríamos carregar neste processo, mas que sabemos não ser possível soltar. Cabe-nos ajustamentos e fazemos isto todos os dias, em todos os turnos escolares.

Em cinquenta anos, será que é possível contar quantas histórias já aconteceram por aqui? Obviamente não. Mas é possível fazer um exercício de reflexão. Quantas palavras ensinadas, quantos desenhos coloridos? Quantas vezes a mão de um professor conduziu um pequeno assustado em seus primeiros momentos de escola? Quantas lágrimas foram acolhidas? E homenagens com cantos, poemas e brincadeiras? Quantas vezes foram limpas as salas após um turno pleno da energia de gerações? Quantos debates? E momentos cívicos, de exaltação à pátria? Quantas merendas servidas, inclusive para aqueles que tem ali a principal refeição? Quantos telefonemas em busca de soluções junto aos dilemas vivenciados cotidianamente? Encaminhamentos? E ainda, quantas vezes o nosso ouvir ajudou na resolução de conflitos familiares? Quantas intervenções foram feitas para que os trabalhos transcorressem bem? Quantas experiências de aprendizagem, de superação da timidez, descobertas? Quantas vezes o socorro àquele que se machucou? E quantas vezes precisamos retomar conceitos, revisar posturas? Quantas orações em busca de paz, de um ambiente propício? Impossível mensurar. Mesmo assim, façamos este exercício. Pensemos a possibilidade de colocar em um único lugar todo o contingente de pessoas, alunos, pais, professores, funcionários que passaram por uma instituição cinquentenária cruzando suas histórias... Que espaço precisaríamos? Será que sabemos o que isto quer dizer?

Quando iniciei minha vida docente não imaginei que um dia também passaria pela desafiadora experiência de uma equipe diretiva. No entanto, a vida desafia, propõe etapas. Percebo este papel como um divisor de águas. Hoje tenho a noção do contrato de risco que assinamos ao assumir tal papel em uma escola. Quem olha de fora, atribui às direções poderes descomunais. Superpoderes. E, na realidade, o único poder do qual dispomos é a coragem. É com esta característica que chegamos em nosso local de trabalho e atendemos a toda gama de demandas sem olhar para o relógio. Dificuldades trazidas por alunos e pais, por professores também. Atrasos, faltas, doenças, medos, febres, ferimentos, raivas, perdas, excessos, fobias, ausências, tropeços, desejos, traquinagens... E lá corremos, no mais puro interesse de melhorar a engrenagem e não apenas integrá-la. Ainda assim, sabemos que ocorrem falhas. Falhas que seguramente seriam minimizadas se houvesse parceria real entre família, escola e governo. Se cada um assumisse e honrasse esta parceria, não apenas cobrando discutíveis direitos e esperando benesses.

Minha escola, nossa escola, a escola que carrega o nome do município. Quem ali entra percebe o zelo com que se busca cuidá-la, apesar de algumas precariedades. Conte-se os três turnos de funcionamento e o fluxo contínuo de pessoas neste espaço. Multiplique-se pelos anos já vividos. Quem sabe esta conta pode nos ajudar a perceber o quanto somos pequenos diante do mundo? Ou grandes? Depende do que fazemos com a nossa história.

Edileine Carvalho Bisinella
Vice-diretora da EEEF CANOAS

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