Agradeço a todos que leram, compreenderam e deram apoio a estas palavras. E, a pedido de muitas pessoas que não leram, repito aqui, na íntegra.
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Poder? Apenas coragem.
Faço
parte da equipe diretiva de uma grande escola pública. Uma
grande escola, não em espaço físico ou por apresentar caríssimos
recursos pedagógicos, pois nossa realidade é bem o oposto disto.
Grande em história. Em 2013, o Grupo Escolar do Centro, hoje
Escola Estadual de Ensino Fundamental Canoas,
completa 50 anos.
Sou
professora e vice-diretora, junto a corajosa equipe que coordena este
espaço. Fomos eleitas para
um segundo mandato. É comum vermos esta situação: a recondução
de pessoas que abraçam o trabalho, que fazem dele mais do que uma
tarefa e por isso, ganham a confiança de sua comunidade. Na Escola
Canoas, isto não é nenhuma novidade, já
que por vezes as equipes diretivas se repetiram.
No
ano do cinquentenário, quero
também, como parte desta equipe, externar um grito de alerta, ou
apenas de desabafo. Há uma
sufocação pairando no ar. E
assim é preciso respirar, inflar-nos de arejamento. Somos
parte de uma engrenagem maior, a educação. Colaboramos com este
andar, tentando alavancar resultados. Sentimos o peso de cargas que
não deveríamos carregar neste processo, mas que sabemos não ser
possível soltar. Cabe-nos
ajustamentos e fazemos isto todos os dias, em todos os turnos
escolares.
Em
cinquenta anos, será que é possível contar quantas histórias já
aconteceram por aqui? Obviamente não. Mas é possível fazer um
exercício de reflexão. Quantas palavras ensinadas, quantos desenhos
coloridos? Quantas vezes a mão de um professor conduziu um pequeno
assustado em seus primeiros momentos de escola? Quantas lágrimas
foram acolhidas? E homenagens
com cantos, poemas e brincadeiras?
Quantas vezes foram limpas as salas após um turno pleno da energia
de gerações? Quantos debates? E
momentos cívicos, de exaltação à pátria? Quantas merendas
servidas, inclusive para aqueles que tem ali a principal refeição?
Quantos telefonemas em busca
de soluções junto aos dilemas vivenciados cotidianamente?
Encaminhamentos? E ainda,
quantas vezes o nosso ouvir ajudou na resolução de conflitos
familiares? Quantas intervenções foram feitas para que os trabalhos
transcorressem bem? Quantas
experiências de aprendizagem, de superação da timidez,
descobertas? Quantas vezes o socorro àquele
que se machucou? E quantas
vezes precisamos retomar conceitos, revisar posturas?
Quantas orações em busca de paz, de um ambiente propício?
Impossível mensurar. Mesmo assim, façamos este exercício. Pensemos
a possibilidade de colocar em um único lugar todo o contingente de
pessoas, alunos, pais, professores, funcionários que passaram por
uma instituição cinquentenária cruzando suas histórias... Que
espaço precisaríamos? Será que sabemos o que isto quer dizer?
Quando
iniciei minha vida docente não imaginei que um dia também passaria
pela desafiadora experiência
de uma equipe diretiva. No
entanto, a vida desafia,
propõe etapas. Percebo este papel como um divisor de águas. Hoje
tenho a noção do contrato de risco que assinamos ao assumir tal
papel em uma escola. Quem olha de fora, atribui às direções
poderes descomunais. Superpoderes. E, na realidade, o único poder do
qual dispomos é a coragem. É com esta característica que chegamos
em nosso local de trabalho e atendemos a toda gama de demandas sem
olhar para o
relógio. Dificuldades trazidas por alunos e pais, por professores
também. Atrasos, faltas, doenças, medos, febres, ferimentos,
raivas, perdas, excessos, fobias, ausências,
tropeços, desejos, traquinagens...
E lá corremos, no mais puro
interesse de melhorar a engrenagem e
não apenas integrá-la.
Ainda assim, sabemos que ocorrem falhas. Falhas que seguramente
seriam minimizadas se houvesse parceria real entre família, escola e
governo. Se cada um assumisse e honrasse esta parceria, não apenas
cobrando discutíveis
direitos e esperando
benesses.
Minha
escola, nossa escola, a escola que carrega o nome do município. Quem
ali entra percebe o zelo com que se busca cuidá-la, apesar de
algumas precariedades. Conte-se os três turnos de funcionamento e o
fluxo contínuo de pessoas neste espaço. Multiplique-se pelos anos
já vividos. Quem sabe esta conta pode nos ajudar a perceber o quanto
somos pequenos diante do mundo? Ou grandes? Depende do que fazemos
com a
nossa história.
Edileine Carvalho Bisinella
Vice-diretora da EEEF CANOAS
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